segunda-feira, 25 de abril de 2011

Estudo Dirigido -Tontura



Caso clínico: Adauto Pressório

Você se lembra do Sr. Adauto Pressório?! Ele tem 50 anos e é hipertenso, diabético e obeso. Trabalha como taxista.
O Sr. Adauto Pressório te procura porque começou com vertigem há cerca de um mês que “aparece e desaparece”, dependendo do movimento que ele faz com a cabeça. Ele não tem conseguido se concentrar nas suas atividades diárias por causa do medo da tontura aparecer.
Tudo começou quando Sr. Adauto foi trocar a lâmpada da cozinha. Quase caiu da escada! O mundo começou a rodar e, desde então, sempre que move a cabeça no sentido antero-posterior tem a sensação rotatória, que dura só cerca de um minuto, mas que é muito forte. Ele estava com medo de estar tendo um “derrame”. Mas a vizinha, Dona Joaquina, tranqüilizou-o. Já conhecia aquela “doença”, pois ela sofria do mesmo tormento. Disse que era “labirintite”. Receitou para o Sr. Adauto um “remedinho” que ela vinha tomando há muitos meses: cinarizina (antagonista de canal de cálcio).
Como o Sr. Adauto não estava com tempo para ir ao médico, pois era fim de ano, época em que fazia mais dinheiro na profissão, começou a tomar a medicação por conta própria. O balconista da farmácia orientou-o para tomar 1 comprimido de 25mg de 8 em 8 horas.
Depois de 15 dias de estar tomando a cinarizina, Sr. Adauto continuava com a “labirintite”. Ele estava se sentindo triste e desanimado. Para complicar, a glicose tinha começado a subir e ele não sabia o motivo. Seguia o regime que você tinha indicado e estava tomando os remédios. Só não estava indo no “grupo de diabetes” do Centro de Saúde porque não tem tempo.
Contou que fez uma “corrida” para um cliente antigo do Taxi que também tinha tontura. Conversaram durante o trajeto e Sr. Adauto aprendeu que Ginkgo biloba é um “santo remédio” para labirintite. Vem das plantas, é muito usado na China e não faz mal algum. Resolveu começar a tomar.
Você aborda as características da tontura quanto ao tempo de duração, intensidade, fatores agravantes, atenuantes e medicamentos em uso. Veja no quadro os medicamentos que Sr. Adauto vem tomando.

Hidroclorotiazida
25 mg/ pela manhã
Enalapril
20 mg/12 em 12 horas
Sinvastatina
20 mg, junto com a dose noturna do enalapril
Ácido acetil-salicílico
100 mg na hora do almoço
Metiformina
850 mg/ 12 em 12 horas
Cinarizina
25 mg/ 8 em 8 horas
Ginkgo biloba
80 mg/ 12 em 12 horas

1-1     Faça uma lista com os efeitos adversos da cinarizina e da Gingko biloba. Marque aqueles que podem ser observados no relato do Sr. Adauto Pressório.
Cinarizina:
·           Parkinsonismo (pois o bloqueio dos canais de cálcio dos neurônios dos núcleos da base pode interferir no sistema dopaminérgico causando depleção de dopamina);
·           Sonolência e, principalmente, sedação;
·           Ganho de peso (observado indiretamente na queixa do Sr. Adauto, através do aumento da glicemia);
·      Depressão;
·      Fadiga;
·      Cefaléia;
·      Desconforto epigástrico;
·      Ansiedade;
·      Retenção urinária;
·      Boca seca.
Ginkgo biloba:
·           Crises epilépticas devido ao efeito tóxico do ácido ginkgólico;
·           Interação com ácido acetilsalicílico: hemorragia craniana.


1-2     Porque a associação Gingko biloba com ácido acetilsalicílico é perigosa para o paciente, sendo formalmente contra-indicada?
O Ginkgo biloba  em dois princípios bioativos, sendo que um deles tem ação de anti-agragante plaquetário. Assim, podem ocorrer efeitos aditivos na antiagregação plaquetária do ginkgo biloba e do ácido acetilsalicílico que aumenta o risco de hemorragia craniana.


1-3     Além de causar parkinsonismo, porque a cinarizina ou a flunarizina não devem ser prescritas para idosos?
Os idosos são particularmente suscetíveis aos efeitos adversos das medicações supressoras do sistema vestibular, sendo que uma das mais frequentes é a sedação. A sedação nessa faixa etária aumenta o risco de quedas (importante fator de morbidade e mortalidade nessa população) e favorece a ocorrência de depressão. Além disso, nesta faixa etária a polifarmácia é comum, e os efeitos sedativos da cinarizina e da flunarizina podem ser aditivos na inibição do SNC quando combinadas com outras drogas. Por fim, o uso crônico de drogas supressoras do sistema vestibular inibe a compensação vestibular.


1-4     Qual é a melhor indicação para se prescrever a cinarizina ou a flunarizina: vertigem aguda ou crônica? Justifique.
A Cinarizina ou a flunarizina devem ser prescritas para o tratamento da vertigem aguda. Isso porque são medicamentos supressores do sistema vestibular, ou seja, são utilizadas para o tratamentos das crises de vertigem ao inibirem o mecanismo de geração da vertigem, mas não a sua causa. O uso crônico de supressores do sistema vestibular tem como limitação o efeito sedativo e, além disso, pode inibir o sistema de compensação vestibular.

Atenção: Embora a Ginkgo biloba seja um dos fitoterápicos mais prescritos, a literatura carece de estudos confiáveis que dêem suporte para seu uso na prática clínica. Logo, este medicamento não deve fazer parte do seu arsenal terapêutico.
Reflita sobre os interesses da indústria farmacêutica na prescrição médica.


A suspeita diagnóstica para a tontura do Sr. Adauto é “vertigem posicional paroxística benigna (VPPB)”. 
A vertigem posicional benigna é uma das formas mais comuns de vertigem. A vertigem e os demais sintomas da VPPB (vertigem e nistagmo de origem súbita que ocorrem exclusivamente com o movimento da cabeça na direção da orelha afetada) são atribuídos ao deslocamento anormal das partículas de otólitos provenientes da mácula do utrículo, que excitam a ampola de um ou mais canais semicirculares, transformando-os em órgãos sensíveis à gravidade. A duração da vertigem é geralmente de 5 a 30 segundos, podendo estar frequentemente associada com náusea. Esta disfunção ocorre de forma idiopática em muitos pacientes, mas pode ser secundária ao envelhecimento do sistema vestibular, ao traumatismo da orelha interna, a doenças otológicas, à labirintite, à neurite vestibular, à insuficiência circulatória na distribuição da artéria vestibular anterior, ao uso de medicamentos ototóxicos, à hidropisia endolinfática, à migrânea, entre outras causas. O teste de Dix-Hallpike é usado para o diagnóstico. O tratamento é feito através de manobras de reposição dos otólitos do ouvido interno (manobra de Epley).



Após fazer o teste de Dix-Hallpike, você confirma que o diagnóstico da vertigem do Sr. Adauto é VPPB. Faz a manobra de reposição para tratar a VPPB e diz para o Sr. Adauto para suspender a cinarizina e a Ginkgo biloba e retornar em 15 dias para você avaliar se a “labirintite” melhorou.
Sr. Adauto retorna após 15 dias e está satisfeito porque a labirintite tinha resolvido. Ele informa, contudo, que não teve coragem de parar de tomar a cinarizina e a Ginkgo biloba. Disse que tem pânico só de pensar que a labirintite pode voltar e que “tem certeza” de que os remédios ajudam a prevenir labirintite. Argumenta que tem muitos amigos/parentes que tomam esses dois medicamentos. Está irredutível quanto à suspensão.
Perguntado sobre outras queixas, informa que continua com dificuldade para controlar a glicose, que está ganhando peso, apesar do regime alimentar e que tem estado triste ultimamente. Pede para você prescrever “Diazepan” porque uma vizinha, Dona Josefina, disse para ele que este remédio “melhora tristeza e faz agente dormir bem”.
1-5     Use no mínimo três argumentos com base nos efeitos adversos e interação medicamentosa da cinarizina e da Ginkgo biloba que convençam Sr. Adauto sobre a necessidade de suspender tais medicações.
1 – A  cinarizina pode estar causando o ganho de peso;
2 – A cinarizina pode estar causando o aumento de glicose indiretamente, através do ganho de peso;
3 – A tristeza pode estar sendo causada pela cinarizina (depressão);
4 – A gingko biloba em associação ao AAS pode causar hemorragia craniana;
5 – Esses medicamentos não estavam fazendo efeito antes, então muito provavelmente não têm papel na melhora da “labirintite”;
6 – A cinarizina poderá causar sedação importante a longo prazo, além de parkinsonismo;
7 – A Gingko biloba poderá causar crises convulsivas.


1-6     Sobre a demanda do Sr. Adauto por diazepam, faça uma avaliação crítica, com base na farmacologia e na farmacocinética, sobre o uso desse benzodiazepínico como indutor de sono e como antidepressivo.
O diazepam é um medicamento benzodiazepínico agonista dos receptores pós-sinápticos do ácido gama-aminobutírico (GABA). Logo, tem efeito ansiolítico, miorelaxante e anticonvulsivantes devido à potencialização deste neurotransmissor inibitório do SNC. Assim, não é um indutor direto do sono, mas pode facilitá-lo através da redução da ansiedade. Do mesmo modo, pode atuar indiretamente como antidepressivo. Entretanto, é um medicamento com inúmeros efeitos adversos, como cansaço, sonolência, relaxamento muscular, confusão mental, constipação, depressão, diplopia, disartria, cefaléia, hipotensão, incontinência urinária, náusea, rash cutâneo, fala enrolada, tremor, retenção urinária, tonteira e distúrbios de acomodação visual; muito raramente podem ser observados: elevação das transaminases e da fosfatase alcalina, assim como icterícia. Como ocorre com todos os hipnóticos, sedativos e tranqüilizantes, no tratamento prolongado existe o risco de farmacodependência em pessoas predispostas, podendo ocorrer síndrome de abstinência com a retirada abrupta do medicamento. Deste modo, a interrupção do tratamento deve ser feita de maneira gradual. Por fim, o diazepam não atua sobre a causa de depressão/ansiedade, não sendo o melhor medicamento para indução de sono e controle de depressão.


Caso clínico:

Tontina da Silva: 21 anos, universitária, filha única, boa saúde.
Você está de plantão na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Distrito Norte. Chega a paciente amparada pelos pais. Eles já chegam chorando, completamente histéricos. – Minha filha está tendo “ataque dos nervos”, diz o pai! – entortou a boca e não pára em pé de tanta tontura!!
Você, tranqüilo, confere os sinais vitais. Tudo Ok. Já na inspeção, observa que Tontina está com paralisia facial esquerda. Pergunta quando tudo começou. Os pais informam que há cerca de 4 horas. Ela estava bem quando, de repente, começou a ver tudo rodar. Veio enjôo, suor frio. Tontina vomitou e ao lavar a boca, sentiu que não conseguia conter o líquido ao bochechar.
No exame físico, você observa que Tontina tem um nistagmo que bate para o lado direito. A prova de Romberg mostra queda para o lado esquerdo. Com exceção do facial, todos os outros pares cranianos estão normais. O exame neurológico também está normal.

2-1     Leia o item “neuronite vestibular” no texto “Tontura: tratamento medicamentoso”. Com base nas informações, defina o tratamento.
A neuronite vestibular é uma inflamação aguda do nervo vestibular e tem sido atualmente justificada como sendo decorrente de uma reativação do vírus do herpes simples tipo I na orelha interna. Assim, a conduta terapêutica consiste no uso de corticorteróides e de supressores do labirinto durante a crise. O uso de medicação antiviral depende do tempo de início dos sintomas e se há comprometimento coclear e/ou facial associado, sendo que ela só tem ação se iniciada durante o período de replicação viral (nos primeiros três dias de infecção). Em relação ao comprometimento facial, foi demonstrado que uma associação de corticosteróides e antiretroviral apresentou resposta terapêutica superior quando comparada ao tratamento com prednisona como única droga. Assim, faria uma prescrição:
·         Prednisona: 60mg/dia x 5 dias, seguidos de 30mg/dia x 2 dias, seguidos de 10mg/dia x 2 dias.
·         Valaciclovir: 1.000/dia x 5 dias.


2-2     Para tratar Tontina, você escolheria cinarizina como monoterapia ou optaria por cinarizina associada ao dimenidrinato? Justifique.
Optaria por associar cinarizina associada ao dimenidrato. Isso porque essa associação promove melhor controle da vertigem sem aumento da sedação.




Fim do estudo dirigido.